Graças a uma (excelente) amiga que eu tenho conheci o pessoal do Instituto Cultural da Dinamarca no Brasil e após uma breve conversa sobre jogos e educação ambiental fui convidado para discutir sobre jogos, meio ambiente e tatus. durante a apresentação e demonstração do jogo de ação ambiental digital PoN! A Ilha dos Tatus.
As origens
O termo PoN!, se refere ao trabalho do filósofo francês Bruno Latour e seus pontos estão no livro Politics of Nature – How to Bring the Sciences into Democracy (Políticas da Natureza: como trazer as ciências para a democracia). O autor vai além das questões superficiais, seu objetivo é discutir a própria relação das ciências com a democracia e aborda o que pode ser entendido como uma filosofia ambiental. Em sua análise dos desafios da política ambiental ele afirma que os grandes obstáculos estão na nossa forma de pensar, o que bate com a minha ideia de que um dos grandes obstáculos à educação ambiental está na dissonância cognitiva.

Desse arcabouço teórico surgiu primeiro um jogo de tabuleiro criado pelos designers dinamarqueses Jacob Raffen e Frederik Lassen.
O jogo
Esse é um jogo de ação focado em celulares e tablets, com opções para jogo solo e cooperativo com foco em jovens de 13 a 15 anos desenvolvido pela produtora brasileira Ilex Games através de uma parceria entre organizações europeias e brasileiras. Na história, o jogador é um tatu que mora numa ilha que está sendo atacada por robôs. Ele deve enfrentar os robôs para salvar a ilha e descobre que há outros tatus presos dentro dos robôs.

Como entusiasta do uso de jogos para educação ambiental eu achei a ideia excelente. Um dos pontos que me chamou atenção foi que ele não “flutua no vácuo”. Mais do que uma iniciativa criativa fechada em si mesma, como já vi outras vezes, o Ilha dos Tatus foi planejado desde o início para uso em ambiente escolar. Ele tem um material pedagógico próprio e a equipe do jogo está validando seu uso em escolas. O jogo já tem inclusive versões em inglês, francês e espanhol e espero que logo também esteja sendo testado em países estrangeiros.
O evento
Fui convidado para participar em uma tarde de apresentação e demonstração do jogo, promovida pela Delegação da União Europeia no Brasil em parceria com a EUNIC e Ministério do Meio Ambiente (MMA) – com apoio do Instituto Cultural da Dinamarca (ICD) e o Goethe-Institut.
O evento teve uma apresentação do jogo PON! conduzida por Tainá Felix, sócia-fundadora na Game e Arte a produtora do jogo e também consultora pedagógica. Como a melhor forma de se entender um jogo é jogando mesmo, em seguida participamos de uma sessão de jogo via celular para junto com alunos de uma escola pública do Gama. Achei a ideia bem interessante, os alunos funcionaram como facilitadores para ajudar os convidados do evento a jogar. Assim foi possível ver como se joga e também observar como o público alvo do jogo o entende e usa.
No final, participei de uma discussão com vários profissionais com diferentes experiências para falar sobre jogos, educação, mudanças climáticas e a questão ambiental. A discussão foi mediada pela Tainá da Gane e Arte e os participantes, além de mim, foram:
- Paloma Costa, ativista climática e co-fundadora do Youth Climate Justice Fund.
- Gilmar Galache, idealizador da Associação Cultural de Realizadores Indígenas – ASCURI, no Mato Grosso do Sul. Vencedor do prêmio de Educação em Direitos Humanos Mireya Suárez (UnB/2022).
- Maria Sílvia Rossi, Diretora de Planejamento e Administração do Instituto Nacional de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan.
- Adriana Ramos, Membro da Secretaria Executiva do Instituto Socioambiental e da coordenação do Observatório do Clima. Foi representante da sociedade civil no Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) e no Comitê Orientador do Fundo Amazônia (COFA).
Foi bem legal conversar sobre o assunto com um grupo tão variado, especialmente quanto temos visões tão complementares sobre o assunto. Entre os vários pontos que discutimos, Adriana observou algo bem legal sobre o jogo: que os “vilões” são nada menos que outros tatus, o que é uma excelente metáfora para mostrar que quem destrói o ambiente são outras pessoas como nós e que precisamos convencê-las da importância das questões ambientais, como a mudança climática e o terrível problema que é lidar com o negacionismo climático. Nesse aspecto, eu pontuei como a educação ambiental é um assunto difícil de abordar por ser algo contra-intuitivo e um jogo, por ser um método de aprendizagem que demanda participação ativa do jogador, pode ser uma ferramenta útil ao mostrar que as decisões que tomamos tem um componente ou consequência ambiental.
A Paloma observou como um iniciativa desse tipo pode ser útil para incentivar o engajamento da sociedade e a sobre importância do ativismo como uma ferramenta para produzir mudanças. O que tem muito haver com a própria ideia do ativismo, de envolver as pessoas ativamente na questão para pressionar por soluções. O que me lembrou de um comentário da Adriana de que é melhor um ativista de sofá do que ativista nenhum.
O Gilmar comentou sobre o seu trabalho em incentivar que os indígenas se tornem produtores de conteúdo e que assumir um papel ativo e contar suas próprias histórias, como no caso dos povos indígenas, é essencial para promover não só as questões ambientais como também as culturais. O que me lembrou muito as ideias do Yuval Hariri de que a habilidade humana de contar histórias é um dos pontos que nos torna únicos e jtambém nos une em diferentes sociedades. O que ressalta a importância do trabalho do Gilmar.
Sobre jogos, outro ponto interessante foi o trabalho da Sílvia Rossi me surpreendeu ao comentar sobre outro jogo, o RPG. Ele é um jogo e também um modo de produção de narrativas, com o qual eu já me envolvi muito, e ela tem um trabalho bem legal com ele em escolas.
O evento foi bem legal e, obviamente, o que descrevi foi uma ínfima amostra das discussões que ocorreram. Eu conheci ótimas pessoas e foi possível ver a diversidade e criatividade de pensamentos sobre algo tão complexos e necessário quanto a questão ambiental.
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