Ao longo do ano de 2021, a escola do infante trabalhou com o tema profissões. A turma visitou diferentes profissionais para conhecer profissões básicas, aquelas que fazem coisas essenciais, como plantar, fazer comida, construir, cozinhar etc. Seguindo esse tema os alunos tiveram atividades variadas como: preparar a terra, plantar, grãos para fazer farinha, construir uma casinha (de verdade) e costurar um boneco. Creio que um do motivo da escolha por essas profissões é por terem resultados mais tangíveis e observáveis pelos alunos. Afinal, explicar utilidade daquele relatório ou planilha para uma criança seria algo muito mais obscuro (e tedioso).
Várias dessas atividades envolveram um espaço de tempo razoavelmente longo para a percepção de tempo de alunos de nível fundamental. Para tanto era preciso realizar uma série de atividades menores que compunham a atividade maior.
Por exemplo, na atividade de plantio foi preciso escolher o local, preparar a terra com adubo, plantar, acompanhar o crescimento das plantas, regar, colher e moer para conseguir a farinha. No caso dos bonecos, foi preciso definir que tipo de boneco seria, costurar as partes e juntar tudo. Para a tarefa de construção de uma casa de parquinho escolar, com tijolos, janelas e tudo mais. Para tanto, foi preciso juntar as famílias da turma na forma de diversos dias de mutirão para fazer as fundações, produzir os tijolos, levantar as paredes, montar as janelas, limpar as telhas, preparar o teto. Como consequência, o final do ano foi marcado por diversas celebrações como a entrega da casa, batismo dos bonecos produzidos, sacos de farinha etc.




Inicialmente, atividades desse tipo podem parecer impossíveis para crianças nessa idade, mas é preciso ter em mente que em educação, o processo pode ser mais importante que os produtos em si. A experiência com esses trabalhos longos acaba servindo como uma introdução ao conceito de projeto, um empreendimento único, com início e fim determinados, que demanda recursos, é conduzido por diversas pessoas e deve atingir os objetivos inicialmente definidos. Ao longo do ano a turma teve a oportunidade de observar que, para funcionar, cada projeto foi sendo quebrado em atividades menores. Viram que grupos podem funcionar de formas variadas com pessoas assumindo diferentes papéis de acordo com a necessidade. Foi possível observar que há demanda para diferentes tipos de habilidades, entender o que é proatividade, que alguém que é bom numa atividade pode ser ruim em outra e perceber que certos trabalhos são viáveis apenas se realizados em equipe, mesmo que isso signifique conflitos e confusões de vez em quando.
Tudo isso pode até soar meio óbvio para um adulto, mas pessoalmente só me lembro de começar a me relacionar com essas coisas do final do ensino médio em diante. Ainda mais se considerar que vejo gente com dificuldade para lidar com projetos inter ou multidisciplinares até na vida adulta. E trabalho de grupo para apresentar seminário é algo muito mais simples do que essa turma lidou ao longo do ano. O foco do ensino médio tende o grande e solitário projeto de passar na universidade.
Assim, a experiência desse ano me parece um exemplo da conhecida aprendizagem tangencial O conceito de aprendizagem tangencial, a ideia de que “podemos aprender indiretamente e ativamente a partir da exposição a uma rica experiência”. (1)
Atualização
Angélica Lira, uma designer e colega de aventuras na escola comunitária comentou que graças a trabalhos como esses os alunos da escola tem contato com uma filosofia de design desde o ensino fundamental. Tanto que ela observa que a Pedagogia waldorf e a Bauhaus, um marco do design, surgiram em contextos sociais próximos. Nesse ponto o design pode ser entendido “como forma de pensamento e de didática, que pode ser aplicado por qualquer indivíduo para enfrentar problemas do dia-a-dia.“(2)
Referência
(1) Aprendizagem Tangencial: Revisão de Literatura sobre os Usos Contemporâneos do Conceito. Disponível em https://www.researchgate.net/publication/330401798_Aprendizagem_Tangencial_Revisao_de_Literatura_sobre_os_Usos_Contemporaneos_do_Conceito [acessado em 28/12/ 2021].
(2) O Design e a Pedagogia Waldorf. Disponível em http://www.adegraf.org.br/artigo/2018/12/o-design-e-a-pedagogia-waldorf/ [acessado em 31/12/2021].
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