A Série

Dentre os diversos programas de divulgação científica que eu gosto, destaco a série “Eu e o Universo” (Brainchild) que pode ser descrita como uma legítima herdeira do Beakman (se você reconheceu o nome já tem idade para declarar imposto). Em 2020 a série está sendo exibida no Netflix, uma produção americana com leves pitadas de reality show. Um dos diferenciais dessa série está nos assuntos. Convenhamos, já existem vários bons programas que abordam astronomia, biologia, química, física e cia. Porém, eu conheço poucos que abordem comportamento tão bem quanto “Eu e o Universo”. Os diversos experimentos apresentados também são ótimos para mostrar como o método científico pode ser empregado para entender pessoas comuns e situações cotidianas. Mais do que um programa infantil, ele vale para toda a família.
O Episódio: Supere os Pais
Esse foi o título do episódio final da primeira temporada e foi num ritmo de quiz show, algo pouco usual para o ritmo da série. A proposta foi mostrar que certas diferenças entre crianças e seus pais são mais profundas que parecem. O que foi discretamente demonstrado através de uma amostra variada e aleatória de pais e filhos. Essa amostra foi dividida em duas equipes opostas, de adultos e crianças. As equipes deviam cumprir diversos desafios impara ver qual seria a equipe vencedora. Ao final de cada prova a cientista residente do programa explicava o que a ciência sabia sobre cada tipo de desafio e reação dos concorrentes. Com um pouco de atenção é possível perceber claramente que cada prova foi modelada como se fosse um experimento de psicologia ou neurologia.
A primeira vista seria óbvio que os pais, adultos no auge do potencial humano, iriam ganhar. Mas uma das belezas de uma boa divulgação científica é mostrar de forma metódica e clara como o mundo pode ser mais diverso e surpreendente que o nosso senso comum é capaz de conceber. Assim, foram mostradas algumas situações em que as crianças eram mais capazes que os adultos. Não vou fazer spoiler, portanto ninguém vai saber o resultado final por aqui, recomendo sinceramente ver o episódio primeiro.
Desdobramentos educacionais
Creio que o objetivo principal do episódio foi mostrar que, além do óbvio de crianças não serem adultos em miniatura, elas podem ser até mais capazes do que nós pensamos. Perceber essas diferenças é importante para saber o que se pode esperar, ou não, de acordo com a idade da pessoa.
O essencial é perceber que nosso cérebro muda ao longo da vida, em forma e fisiologia. O que me pareceu bem de acordo com certas linhas pedagógicas como a pedagogia Waldorf . Por sinal, essa pedagogia diferencia o ser humano por ciclos de sete anos, chamados setênios, onde cada ciclo tem suas peculiaridades. Nessa linha pedagógica também existe um esforço em combinar as capacidades corporais e as intelectuais, vistas como um sistema único e conectado. Algo que ficou bem nítido ao longo do episódio.
Muitas das “vantagens” das crianças podem ser relacionadas ao que o Dr. Peter Gray chamou de habilidades intelectuais. Essas têm a ver com a capacidade como raciocinar, formular hipóteses, explorar, compreender e dar sentido ao mundo à sua volta. O Dr. Gray considera que as crianças são naturalmente intelectuais, curiosas e estão constantemente buscando entender o ambiente físico e social. Acho que algumas vantagens perceptivas mostradas durante episódio ilustram isso muito bem. Uma criança comum nasce com essas habilidades e pode se desenvolver ainda mais com o passar do tempo, mas ela faz isso de seu próprio modo e em seu próprio tempo através de exploração, observação, brincar e questionar. É algo que não pode ser ensinado diretamente, mas pode ser incentivado ou, pelo menos, pode se oferecer condições para que a criança se desenvolva. É nisso que se baseiam certas linhas pedagógicas como o construtivismo e a própria pedagogia waldorf. Outro tipo de habilidade seria a acadêmica e a pressão por seu ensino desde a infância já foi tema de outro artigo.
Conclusão
Entender as diferenças entre crianças e adultos é especialmente interessante para que os pais saibam aproveitar melhor certas janelas de oportunidade em aprendizagem que não são infinitas. O episódio também permite, tanto para os pais quanto para os filhos, entender que certos comportamentos não são simples desleixo ou má-vontade, mas reflexo das diferentes fases da vida de cada um. Fica a dica: crianças podem ser mais capazes do que se espera, mas não vai ser necessariamente no tópico que os pais gostariam. Veja mais no programa.
Eu já era adulto, mas a-ma-va o Beakman! Por incrivel q pareça, sites de divulgação científica me ajuaram muito em meu trajeto de pesquisador da área de cultura material.
Afinal, para saber como um prato quebra (escrev um bom artigo sobre lixo como cultura material) não preciso de um doutorado em física.
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Verdade, nesse aspecto acho até que as coisas melhoraram, a divulgação científica está sendo vista com muito mais importância que antigamente. Ainda que seja para fazer frente aos problemas atuais.
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