Sobre comportamentos indesejáveis e uma jornada extraordinária


Criança no colo de um adulto passeando em uma plantação ao por do sol
Foto por Daria Obymaha em Pexels.com

Em um artigo sobre os comportamentos indesejáveis das crianças, Kyle Pruett não apenas analisou alguns desses comportamentos mas também levantou algo ainda mais importante.

Indesejável, entre aspas

Aqui temos as famosas birras, brigas, gritos etc. Esses comportamentos são tão frequentes que a internet está cheia de influenciadores e especialistas com dicas, conselhos, livros e cursos para resolver a questão. Alguns são excelentes, outros nem tanto.

É nesse ponto que o autor questiona se o termo indesejável é adequado. Como a linguagem muitas vezes influencia nossa atitude, o “indesejável” é visto é algo a ser evitado. Porém, esses comportamentos, que realmente são cansativos e desgastantes , também são parte parte do processo de desenvolvimento de habilidades e do instrumental necessário para lidar com a vida. Não seriam problemas a serem removidos, mas degraus a serem superados.

Por exemplo, muitos desses comportamentos são reflexos do desejo por atenção. Ainda que esse desejo também seja desgastante para quem cuida (experiência própria), ele em si não é uma coisa ruim. Crianças dependem na nossa atenção para sobreviver, seres mais inteligentes tem uma infância mais longa, o período de dependência de um filhote de corvo é maior que o de um pintinho. Talvez um cérebro mais denso e capaz seja mais difícil de organizar. Atenção do ponto de vista infantil é um sinal de segurança, o que reduz a ansiedade.

Sobre essa tal ansiedade encontrei um video do @queridopediatra que descreve bem a diferença de comportamento observada em bebês neglicenciados. A ansiedade é um dos sintomas mais observáveis. Essa ansiedade provocada pela negligência provavelmente vai ter impacto ao longo da vida. É por isso que crianças apresentam “ansiedade de separação”, tão visível nos primeiros dias de escola, a qual o autor prefere chamar de “consciência de separação” e considera essa fase um degrau normal no processo de crescimento. A separação começa como uma fonte de medo para se tornar algo desejado. Quem convive com crianças observa isso ao longo do crescimento. A ironia, é que a sensação de separação, como a saudade, vai durar mais nos pais do que nos filhos.

Ainda assim, o esforço de criação é grande e parece desequilibrado. Eu acredito que a nossa realidade de longas jornadas de trabalho, núcleos familiares menores, com o menor contato com a família extendida como tios, primos e cia. somada à desigualdade de gênero realmente é custosa, especialmente para as mães. Os constantes (e verdadeiros) relatos de mães exaustas, já caracterizam o que é chamado de síndrome de burnout materno.

A jornada extraordinária

imagem de criança sorridente andando sobre bicicleta laranja em um caminho de terra.
Foto por Tarikul Raana em Pexels.com

Mas apesar de dar um trabalho do cão, o autor recomenda fnão se esquecer do aspecto positivo e fez uma bela lista pontuando a grandeza dessa experiência.

  • As crianças nos dão a chance de sentir e oferecer o amor mais raro: o incondicional
  • Elas são a última chance que vários de nós teremos para reaprender como viver o momento;
  • Educar nos lembra quão pouco reamente entendemos sobre como o mundo funciona quando precisamos explicá-lo. As perguntas, especialmente as difíceis, são uma oportunidade de reflexão.
  • Crianças estão entre os melhores comediantes que existem.
  • Elas nos lembram do poder e beleza das emoções mais básicas, a maioria das quais nos adultos já temos pouca coragem de sentir e expressar.
  • Ninguém nos terá em estima tão alta quanto as crianças que cuidamos.
  • A paternidade/maternidade nos dá a chance de prover a outro uma segurança que provavelmente nunca nos foi oferecida.

Pegando o último argumento eu incluiria: cuidar de uma criança nos dá chance de entender como a forma como fomos tratados na nossa própria infância nos influenciou, de aprender a fazer melhor e, possivelmente, fazer as pazes com a criança traumatizada que existe em cada um de nós.

Um aviso

Reparem que muitos dos pontos citados acima são oportunidades que surgem durante processo de se criar uma criança. Acreditar que cuidar de uma criança necessariamente torna alguém melhor é uma péssima razão para se ter filhos, além de ser um equívoco. Acredito que é muito melhor ser uma pessoa sem filhos do que um pai ou mãe ruim, o estrago é menor.

Conclusão

Em termos de soluções, eu recomendo tomar essa jornada como uma maratona: procure um ritmo razoavelmente confortável, prepare-se para dias mais puxados, crie uma rede de apoio, não se esqueça de descansar e aceite que certos problemas serão resolvidos ao longo do processo e não de uma vez só.

Na jornada da criação o indesejável pode ser um marco a ser vencido. Mas acredito que essa aventura, que está longe de ser um passeio, vale e pena.

Deixe um comentário

Blog no WordPress.com.

Acima ↑