Animes e adolescência: 2 exemplos úteis


Os últimos tempos foram dificeis para a saúde mental de todo mundo, inclusive os menores. Junte o período da pandemia e a pré adolescência e temos um coquetel terrível para as habilidades sociais e saúde mental. Para vários professores, a situação emocional dos alunos se tornou um problema. No ambiente confinado da escola, a ansiedade se espalha quase tão rápido quanto o piolho.

O resultado na minha vizinhança era alguém que detestava ir para a escola. Em princípio, eu considerei isso como absolutamente normal, essas pessoas que dizem amar a escola é que me assustam. Os sinais de alerta começaram a pipocar com o desejo de continuar em aulas online, as negativas em ir à festas dos colegas, e outros eventos que deviam ser divertidos a insistência em ter um ou nenhum colega mais próximo e os avisos de problemas com os colegas. Os avisos que de a escola é um lugar difícil, que fica pior sem amigos, pareciam ter pouco efeito.

No geral, os tratamentos variam de acordo com a intensidade de cada caso e envolvem uma combinação de diversas técnicas, algumas mais suaves e outras nem tanto. Dentre as opções suaves, algo que fale em uma linguagem que eles conhecem e aceitam pode ser tão ou mais efetivo que os conselhos de adulto, evitando a obviedade e chatice. Dentre essas, observei um bom potencial nos animes. Os desenhos animados japoneses são adaptações baseadas nos Mangás, as histórias em quadrinhos japonesas que se tornaram um gênero literário muito rico e diverso. Os animes acompanham os mangás nesse quesito. Um exemplo que já comentei antes foi o famoso Cells at Work.

Por aqui eu descobri duas boas opções. Nada com robôs gigantes, golpes com nome ou gente que fala enquanto luta. Dada a variedade, pode ser um tanto difícil categorizar os animes em gênero, ainda que já existam dezenas deles. Os que me interessaram para esse texto estão nas categorias: slice of life, histórias que mostram como um grupo ou indivíduo vivem; e os Iyashikei e suas mensagens motivacionais. Tudo isso inserido dentro do tema escolar.

Anime 1: sobre comunicação

A primeira opção foi Kommi can´t communicate ou Kommi não consegue se comunicar (um trocadilho que ficou ótimo no inglês). O cenário é a escola particular de ensino médito Itan, onde estuda Shoko Komi, uma estudante incrivelmente popular por sua beleza, comportamento estóico e refinada elegência. Na verdade, ela sofre de transtorno de ansiedade social e o que seus colegas vêem como superioridade é só uma timidez patológica. Um colega bem mediano chamado Tadano percebe quem ela realmente é e passa a ajudá-la no ambicioso objetivo de ter 100 amigos na escola.

A história é uma comédia romântica despretensiosa, com personagens e situações bem exageradas, caricaturais. Há uma óbvia tensão romântica entre Tadano e Kommi durante sua viagem pelo zoológico humano que pode ser o ensino métido. Por aqui, o principal uso do anime foi mostrar para alguém que nem tudo é o que parece na selva escolar e que o colega arrogante ou intimidador pode estar tão constrangido ou perdido quanto você mesmo. O anime também é interessante para abordar algumas questões sobre respeito e consentimento, algo bem útil para entrar nas questões de sexualidade da adolescência.

imagem: Netlifx

Anime 2: sobre objetivos e além

A segunda opção se chama Blue Period, um nome que creio ser referência à fase azul do pintor Pablo Picasso. O anime conta a história do estudante de ensino médio Yatora Yaguchi. Um garoto popular, do tipo que gosta de fumar, beber e assistir futebol com os amigos e está enfrentando alguns dos típicos dilemas do final do ensino médio. Como a famosa questão: “o que vou fazer da minha vida quando a escola acabar”.

A questão é que Yagutchi evita conflitos com os amigos. Levemente delinquente, ele sabe bem como ser o que os outros esperam, mas não sabe o que quer. É alguém que gosta de ter amigos, de ser popular, mas se sente superficial e que falta algo em sua vida. Há um misto de resignação com os papéis que lhe foi dados pela sociedade e pouca esperança com o futuro.

Tudo muda ao resolver pintar sobre o sol batendo numa rua de manhã como um dever de escola e descobrir o mundo das artes. Essa não é a história de alguém genial, de um talento inato, mas de uma pessoa comum que de repente encontra um objetivo e percebe que só vai alcançá-lo com muito esforço. De alguém que descobre muito sobre si e sobre os outros através da arte.

Nesse aspecto, ter estudado história da arte e cia na universidade deixa o anime ainda mais saboroso. Mas a ausência de conhecimento prévio não prejudica a experiência.

A primeira temporada é sobre a trajetória de Yagutchi nas artes e o esforço para entrar numa universidade. Uma atividade cara e de futuro incerto. Ele precisa enfrentar a opinião social, se ajustar novo meio e, claro, praticar muito desenho e pintura. O anime também levanta várias questões sobre a saúde mental dos adolescentes e essa concorrida e complicada nessa fase da vida.

fonte: CBR

Minha abordagem

Basicamente, eu assisto os desenhos acompanhado. Ambos são divertidos e criam um ambiente em comum para puxar conversas e amainar eventuais constrangimentos. Em alguns momento salpico alguns comentários , observando como algo pode ser engraçado, complicado ou se algo similar já ocorreu comigo. É importante ser despretensioso e evitar que a conversa vire uma palestra ou interrogatório, abordar com desapego é fundamental.

Dos cuidados a serem considerados ao assistir: Kommi tem metáforas sexuais discretas, há uma certa objetificação feminina comum a esse tipo de desenho, mas bem mais leve do que eu vejo em outros animes mais populares. Também há bebida, cigarro e questões de saúde mental em Blue Period. Ambos tem questões transgênero e não sei dizer sobre a qualidade da abordagem. No geral eu não achei nada que não possa ser superado com alguma ressalva ou conversa ocasional.

No mais, são trabalhos excelentes, em termos visuais e de história e podem ser uma excelente oportunidade para abordar alguns assuntos espinhosos da adolescencia. Se alguém quiser se aprofundar mais ambos também tem mangás.

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