Após a tragédia resultante das chuvas em São Sebastião, ocorrida em 2023 no estado de São Paulo, Pedro Burgos que é professor de Comunicação no Insper, levantou em seu perfil no twitter uma análise importante sobre a cobertura feita pela da imprensa brasileira.
De fato, até existe um esforço honesto em acompanhar os tristes fatos ocorridos, porém, ele observa que a falta cobertura em termos de pouco trabalho preventivo. Enquanto os serviços públicos criaram sistemas de alerta, como o uso de SMS e até sirenes em áreas de risco, a imprensa falha ao não dar a devida ênfase antes que os problemas aconteçam. Isso é ainda mais contraditório se considerarmos que essa mesma imprensa noticia questões como aquecimento global e o aumento da probabilidade de ocorrência de eventos climáticos extremos há anos. Essa mesma imprensa com frequência também observa como essas catástrofes são sazonais e o poder público pouco faz para prevenir.
Como exemplo de que outra abordagem é possível, o Pedro mostra na figura ao lado como os jornais americanos lidam com a previsão do tempo. Lá é comum se apresentar na primeira pagina uma matéria sobre possível tempo extremo e as instiga as pessoas a fazerem as preparações necessárias. Na figura seguinte, a manchete de primeira página do jornal americano descreve uma provável tempestade de categoria 4 que se aproxima de uma cidade, em contraste co os jornais brasileiros de São Paulo no dia anterior ao desastre de São Sebastião, já era esperada uma chuva extrema. Num exemplo pessoal, o Pedro disse que naquele fim de semana ele mesmo decidiu não ir para o litoral justamente depois de ler a previsão do tempo no jornal. O problema da ênfase está no contexto, não havia primeira página ou notícia sobre a possibilidade de chuvas intensas. Apenas a previsão do tempo usual nos jornais brasileiros.
Como outro usuário do twitter, coloca:
Pedro Zanelli, no twiter.“Infelizmente, a mídia trata previsão do tempo com foco no “vai dar praia?”
O Pedro alega que adquiriu o hábito de dar atenção à previsão do tempo depois de uma temporada morando nos EUA. Tudo bem que um país com terremotos e furacões tem muito mais experiência em lidar com isso. Mas, como observado antes, o aquecimento global e climas extremos estão longe de ser uma surpresa para a imprensa brasileira. No fio do Pedro é até demonstrada uma exceção: o jornal Correio do Povo, do Rio Grande do Sul (próxima figura). Um dos motivos que me faz gostar cada vez mais da pequena imprensa. Outro bom exemplo de divulgação é a empresa MetSul.
Outro ponto que ele criticou na cobertura pós-desastre são as lives: geralmente são momentos improvisados, emocionais e que podem gerar ainda mais problemas que resolver. Especialmente no quesito acalmar uma população que certamente estará assustada e traumatizada. Pessoalmente, detesto as coberturas em tempo real com imagens curtas e repetidas que oferecem muito pouco informação relevante. Me parecem servir mais para gerar ansiedade e mostrar de que o estado e os jornais estão trabalhando.
Só se pode imaginar os motivos. Talvez acho que os grandes jornais tenham medo de avisar sobre um evento negativo que, mesmo que seja provável, impactaria negativamente a indústria do turismo ou seja o medo de serem acusados de propagar a histeria caso o tal evento extremo não aconteça.
E não é por falta de capacidade brasileira no assunto. Na área agrícola o clima sempre foi fundamental, o que levou a diversas pesquisas sobre o assunto. A decisão do momento certo para iniciar o plantio é essencial para as lavouras e o clima é a grande variável. Um exemplo de pesquisa sobre o assunto é o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc), resultado de décadas de pesquisa da Embrapa, que é muito usado para subsidiar a tomada de decisões dos produtores. É tão importante que o Zarc é usado para definir o seguro rural, uma política pública que evita que o agronegócio quebre em caso se uma grande alteração climática. O índice de acerto gira em torno de 80%.
Como o Pedro mostrou em sua experiência pessoal, a informação está lá. O que falta é a decisão editorial de dar a devida ênfase à meteorologia como pauta jornalística. Especialmente antes que os problemas ocorram. Afinal, a grande imprensa já demonstrou várias vezes ter os recursos, experiência e equipe para cobrir os estragos depois que eles acontecem. Assim como o poder público deve ser mais preventivo isso também deve ser esperado da imprensa.
Deixe um comentário